quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

DOUZ / TUNISIA

douz: é uma agradável vila tunisina que vive muito do turismo, tirando partido de uma localização privilegiada às portas do deserto do sara. um oásis sariano, onde os turistas podem apreciar o deserto e as suas gentes, sem esforço ou sofrimento, e partir. ou voltar.  DOUZ  E  O DESERTO  EM  BELEZA.


  

Às quintas-feiras, o mercado dos animais instala-se por trás da mesquita junto ao souk (mercado). os turistas chegam às escadas, de máquina fotográfica na mão, mas poucos são os que ousam descer e misturar-se naquele mar de gente e alimárias: do lado direito estão os dromedários, depois os burros, mulas e cavalos, e o restante chão está coberto de ovelhas e cabras de todos os tamanhos. os possíveis compradores deambulam por ali, apalpando garupas, observando dentes e pelagens. muitos usam os trajos árabes dos beduínos, segurando o excesso de tecido com uma mão quando se baixam, corrigindo o cheche da cabeça, enrolando-o e desenrolando-o vezes sem conta. mulheres são raras e modestas, geralmente velhas beduínas com tatuagens no queixo e nas faces, agachadas de modo a caberem quase todas debaixo do lenço, uma mão a segurar os animais pelas cordas. os que venderam com sucesso reconhecem-se pelo minúsculo bulezinho de chá e jogo de copos que trazem debaixo do braço e nos bolsos, distribuindo pelos presentes golos doces de contentamento.
os turistas vêm à procura do deserto e de beduínos. na região de douz coexistem algumas das grandes tribos: os mrazig, os ghrib, os aoulad jaghoub, os adara de zaafrane e os de sabria. debaixo das t-shirts e das jeans estão genuínos beduínos, que conduzem os seus negócios docemente pelo souk, pelos hotéis e restaurantes da vila. e mostram o deserto aos turistas, o deserto onde já não moram há muito tempo mas que tratam como uma mobília antiga lá de casa, atravessando as dunas de mobilete e fazendo piqueniques na areia, onde grelham carne e fazem pão, acompanhando com legmi, a aguardente de palmeira. não são só os velhos garbosos, que passam de albornoz e cheche, nem os que levam uma vida de girassol, a mudar de esquina para acompanhar os lugares onde bate o calor, os verdadeiros beduínos. são-no quase todos, e sabem perfeitamente a que tribo pertencem; os outros, os sedentários que cultivavam o oásis - coisa que durante muito tempo foi considerada desprezível pelos nómadas - são os “papa-melancias”. que aqui são bem boas, por sinal...
os autocarros param junto ao cemitério que fica bem no meio da povoação. por vezes o sol, demasiado ofuscante, ou o vento, que traz a areia para dentro das casas, obriga quem chega a procurar refúgio o mais depressa possível. passam derreados pelas mochilas berrantes, de calções e óculos escuros, seguem ao longo do cemitério para os pequenos hotéis e pensões do centro. sabem que o deserto está perto, mas ainda não o viram. e mesmo o palmeiral do oásis, a sombra fértil que antecede as dunas, só consegue ver-se de algumas ruas.  douz nem é uma terra excepcionalmente bonita, mas é acolhedora, com algo de familiar. o que era bonito já foi devolvido ao deserto: as velhas aldeias de glissia e zaafrane, ali próximas, naufragam lentamente nas vagas de areia branca e fina como farinha, enquanto que, ao lado, junto aos palmeirais, se ergueram paredes novas de tijolo irritantemente cor-de-laranja, e dos terraços de cimento saem tufos de barras de ferro eriçadas.
estes lares, aos quais custa chamar casas, nunca conseguirão transformar-se em areia branca, mas dos pátios continuam a sair dezenas de criancinhas descalças que não têm medo de cavalos ou dromedários. e dizem-me que nas duas estações de camelos de aluguer de douz - perdão, dromedários - conta-se um total de seiscentas a setecentas cabeças. como o tempo das caravanas já passou, a função principal dos bichos é agora passear os turistas, sorte que compartem com alguns cavalos.
os hotéis de luxo também ficam no palmeiral, quase todos virados para a imensidão de dunas, onde também já nasceu um parque de campismo e uma pizzaria. É aqui que ficam os turistas que viajam em grupo: de um lado a frescura do oásis, da piscina e da cerveja; do outro o calor do deserto, os dromedários de aluguer, os fatos “de beduíno” todos iguais, às riscas brancas, os vendedores de cheches e de rosas do deserto. no mês de agosto, quando a temperatura sobe acima dos quarenta graus, são poucos os que se atrevem a sair da sombra e do ar condicionado. mas esse é o mês dos casamentos, da música e das danças nos pátios, onde as verdadeiras rosas do deserto florescem em trajos típicos bordados a ouro, os cabelos soltos sacudidos com violência ao ritmo dos tambores.
para muitos, é o cumprir de um sonho: passear umas horas na imensidão das dunas, bamboleando-se sobre o dromedário que um beduíno leva pela arreata. ao longe, o sara a perder de vista, “grande, monótono, embalador”, como dizia isabelle eberhardt, mudando a cor de branco para avermelhado nas areias em redor de ksar ghilane. e quando chegarem a casa podem dizer: “eu já estive no deserto”. os que não dizem “já”, geralmente voltam.

      

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